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Conto pedagógico: Ouço, desenho e aprendo

“Eu já sei o que falaram sobre mim”. Essa foi a primeira frase que ele desabafou logo após ser convidado a conversar em minha sala. Com um olhar profundo e decepcionado, me ouvia relatar o motivo de estar comigo naquele momento. Expliquei que os professores diziam que ele não realizava as atividades, apresentava desinteresse, em seus cadernos só havia rabiscos e esboços de desenhos. Seu rendimento estava abaixo da média em algumas disciplinas. O aluno, com uma voz rouca como de quem havia acabado de acordar relatou que realmente durante as aulas desenhava e que não conseguia se concentrar, por isso não prestava atenção nas aulas. Como gostava de passar o tempo desenhando, aqueles momentos eram apropriados, uma vez que escrever era seu martírio. Perguntei como seus pais reagiram ao ouvir dos professores na reunião sobre seu desempenho e comportamento. Seu rosto que já estava abatido pareceu ainda mais quando percebi em seus olhos um mar de lágrimas pedindo licença para desaguar. Não conseguiu responder. Ficou calado e segurando suas emoções. Na sala, ouvia somente sua respiração ofegante, como se fosse explodir. Após um tempo respondeu que sentia que era diferente dos colegas e por isso se isolava no fundo da sala. Disse ainda que seus desenhos eram uma forma de fugir daquilo que mais detestava na escola, escrever. O seu olhar falava mais do que palavras, assim como seus desenhos mostravam o quanto era capaz. Fiquei pensando como poderia ajuda – lo. Estava no 9º ano, sem nenhuma reprovação, apresentava um excelente raciocínio lógico matemático, expressava-se bem com muita coerência, porém era visto pelos professores como um aluno desinteressado que só queria desenhar. Ocorreu-me uma ideia que poderia dar certo se eu tivesse o apoio dos professores. Propus ao aluno e aos professores que durante as aulas tudo que o aluno desenhasse tivesse relação com o conteúdo ministrado. A ideia era que ao invés de usar as palavras para registro no caderno, usaria desenhos como substituto da escrita exigida pelos professores. Para o aluno a ideia foi excelente, continuar desenhando sem a crítica dos professores. Entretanto, para os professores foi um desafio, porque não compreendiam a forma como esse aluno aprendia, acharam a ideia absurda, mas decidiram arriscar. Foram dois meses de caminhada, e cada vez que eu visitava sua sala, o percebia mais leve e em alguns momentos até esboçava um sorriso. Seus cadernos estavam repletos de desenhos variados que eu não compreendia, mas ele lia cada traço com destreza. E assim foi um bimestre de muitas cores, traçados e aprendizado. Através dos desenhos, o sentimento que outrora era de insuficiência passou a ser de autoconfiança. Seu rendimento escolar melhorou propiciando um olhar diferenciado dos professores em relação às habilidades e inteligências não apenas dele, mas também dos outros alunos. O aluno entendeu que os desenhos eram a chave para o seu sucesso escolar e quem sabe até o nascimento de um artista....

Renata, orientadora educacional da rede pública de Brasília


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